21 de dez. de 2010

Treze do cinco de dois mil e dez

Um copo, e mais outro. Tudo descia rápido, tanto quanto as palavras saiam facilmente. Aquelas pessoas nunca pareceram tão familiares, todas com dramas similares, com reclamações e medos parecidos, mas antes do próximo gole, parava a olhava atentamente pra cada um e tentava lembrar-se onde o vira pela última vez.
Que coisa. Que conversa agradável! Que clima divertido! Talvez fosse tudo resultado da segunda garrafa de vodka de já estava pela metade, embora não quisesse acreditar. Era bom pensar que se identificava com todas aquelas pessoas, que suas dores e seus questionamentos não eram só seus e que, embora parecesse sozinha, não estava. Havia mais como ela. Alguns piores, que se maquiavam demais, ou pintavam o cabelo de cores incomuns, ou mesmo faziam cortes estranhos. Tinha gente que gostava de se vestir feito punk, embora esse fosse um movimento – e um conceito – de algumas décadas atrás. Tinha quem comesse coisas vivas e quem vivesse em seu próprio lixo. E ela, tão normal, com suas blusinhas da moda, os jeans surrados, os tênis da propaganda na TV, tão excluída do mundo do qual queria fazer parte.
Perdeu a conta de quantas noites passara ali, no chão da praça, com aquelas pessoas estranhas, a maldizer uma sociedade que ninguém sabia ao certo o que era. E cada um dizia como, em seus sonhos, tudo deveria ser. Nessas noites em que todos os problemas da humanidade eram resolvidos depois de uns goles que qualquer bebida quente misturada a refrigerante, não sabia quantas promessas tinha feito para a vida, quantos planos que havia cuspido no vaso no dia seguinte pela manhã, quantos novos amigos havia feito, porque os antigos, da noite passada, aceitaram Jesus no coração, ou quem sabe ainda estão com uma agulha de glicose – ou de sabe-se lá o que – presa no braço. Mais importante, perdeu a conta de quantas noites e dias e tarde quis simplesmente fugir, e fugiu pra tão perto de casa, se afogando em um copo atrás de outro, garrafa atrás de garrafa em um oceano de mágoa que não sabia resolver.
Problemas. Na vida, tudo são problemas, menos quando eles vem na medida exata de 250ml. Um litro só quando a coisa está feia, quando nem a companhia daquelas pessoas estranhas pode ajudar, quando falar mal da faculdade, da família, da política não ajuda.
Lá estava, tão normal, com um copo vazio na mão, porque aprendera a não soltar o copo se não quisesse ser servida por aquelas pessoas estranhas, olhando aqueles sorrisos amarelos de cigarro manifestarem-se em gaitadas entre palavrões e maldizeres e tudo o que queria era estar em um lugar onde as pessoas soubessem seu nome, onde soubessem que preferia só refrigerante a vodka com limão, que tudo aquilo não passava de uma extravagância a que se permitia por não entender direito o que significava se permitir. Um lugar onde ela soubesse o nome de todos e soubesse que um deles não desapareceria no dia seguinte. Um lugar do qual nenhuma das pessoas pudesse desaparecer porque fariam uma falta tremenda. Um lugar que pudesse chamar de casa.

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