16 de jan. de 2017

Cartas a uma jovem

“Amarei para sempre?”, você me perguntaria, mas não gostaria da resposta: "Você não é mais tão nova para acreditar que se ama para sempre.]'

“Mas não posso deixar de acreditar!”, você responderia, e então seria eu a tirar uma lição: “Agarre-se a isso. Não deixe que lhe digam o contrário.”. Então, percebendo meu semblante de melancolia, você questionaria: “Você já sofreu?”, ao que minha resposta mais uma vez não seria do seu agrado: “Talvez ainda não tudo o que preciso.”; “Por que alguém precisaria sofrer?”, seu olhar questionador não ignoraria essa. Porém, ainda que eu tivesse essa resposta, não lha poderia dar. Nesse momento, eu me calaria.

Incomodada com o silêncio, pois lembro que aprendemos a valorizá-lo anos mais tarde, você tornaria a falar de amor: “E a quem confia seu coração agora?”. Dessa vez, você não compreenderia minha demora em responder, nem entenderia quando eu explicasse que meu coração não está mais preso a outro. “Meu coração está confiado a mim mesma”, eu lhe diria, “e essa é a maior responsabilidade que já assumi.”. É provável que tal afirmação fosse deveras assustadora e inquietante para você, e precisaria digeri-la lentamente. O silêncio se faria presente mais uma vez, para meu agrado, enquanto mil outras perguntas lhe tirariam o sossego.

“E de quem você cuida?”, voltaria a me perguntar, incrédula de tudo o que lhe expusera antecipadamente. E mais uma vez era provável que me julgasse louca me ouvindo dizer: “De mim mesma.”. Poderia ajudá-la a compreender, discorrendo com precisão sobre por que as pessoas não dependem umas das outras e que o amor vem de dentro e não de fora. Mas lembro que, à essa idade, esses sentimentos já despontavam e afligiam. Julgo que os alcançaria sozinha.

A bem da verdade, haveria pouco que eu pudesse lhe ensinar. Talvez a ouvir mais sua própria mente e a confiar mais em seus instintos. O resto, você aprenderia, quiçá, melhor e mais rápido do que eu. Não me arrependeria de dedicar a você algumas horas todos os dias, mas você, inquieta se bem me lembro, não teria paciência para as minhas sobriedades. Não seríamos boas amiga, você e eu. Seríamos, no melhor dos casos, colegas de trabalho que estão unidas pela mesma causa, mas que seguem por caminhos distintos. Nossos objetivos são outros, e, vale ressaltar, você ainda os chama de sonhos. Mas bem que gostaria de poder olhar nos seus olhos e sentir de novo aquela chama que um dia me consumiu e que, a você, esperamos, consuma até o fim dos dias. E, num rompante de curiosidade, na crença de que olhar para trás me ensinaria sobre o presente, me permitiria perguntar: “O que te arde?”, para, desanimada e desesperançosa, sabendo-me preguiçosa para esse tipo de empreitada, ouvir sua voz, forte, dizer “Tudo!”.

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